Vulcão em Erupção

Passava uma reportagem na TV a respeito de atividades vulcânicas pelo mundo, quando ela se viu, enfim, entrar em erupção. Pegou papel e caneta, sentou-se, sozinha, à mesa da sala e começou a expelir seus sentimentos, que despertaram quentes como fogo, devastadores como larvas.



“Pronto, aconteceu. Meu coração resolveu explodir, e agora, salve-se quem puder – salve-me quem puder. Seu olhar está me queimando, está aquecendo terras que há muito tempo não sabiam o que era calor. Pára, sai de perto de mim com este sorriso que me faz querer sorrir também, vai pra longe com esta voz que me dá vontade de calar só para poder ouvi-la melhor, sai de dentro do meu coração, pois não sei até quando conseguirei fingir que você não está ocupando a sala inteira. Sai daqui, antes que eu tenha que me expulsar para que a sua presença reine absoluta.



Meus disfarces são de quinta categoria, feitos por um alfaiate que não aprendeu a costurar fantasias para si mesmo. Não sei brincar de esconde-esconde e se eu resolver fazer isso, logo, logo ouvirei dizê-lo: ‘1, 2, 3! Achei você’. Me escondo nos lugares mais óbvios, não tenho a menor criatividade para construir esconderijos fora da minha terra, fora dos limites do meu terreno, fora do meu olhar. Olha só quanta idiotice: agora, por exemplo, estou tentando me esconder neste texto, nestas palavras que só me expõem ao risco de ser achada por todo mundo e me perder de si própria.



Poxa, não fica por perto não. Este seu abraço tá me tirando de um sono profundo, mas não parece capaz de me segurar quando a lucidez, finalmente, chegar. Estou em erupção! Esta carta está derramando sentimentos que queimam feito larvas, que latejam feito fogo. Estou me derramando junto com eles e tenho quase certeza que você nem imagina que é por você. Mas é, garoto. Sai daqui enquanto ainda dá tempo de você não me ganhar de mim.



Vê se me entende, colabora aí, vai. Faça o que você quiser, fique com quem te der na telha, só não me invade com esta risada que me inunda, só não me engana com este abraço que me aquece, só não me fala com esta boca que não quer me beijar. Se toca, cara. Cai fora deste barco porque o estou remando sem direção, salta deste trem desgovernado enquanto ainda dá tempo, corre deste circo onde o palhaço não sabe como fazer graça.



Estou te desejando. Desejando ficar ao seu lado durante os jogos da próxima Copa do Mundo, desejando não sair de perto quando todos forem para longe, desejando a tua presença para não fazer valer a minha ausência. É em você que penso quando jogo moedinhas para o alto na fonte dos desejos, é o teu nome que eu chamo quando me esqueço do meu, é o seu carinho que eu quero quando nada mais acalenta.



Sai de perto, vai pra longe, cai fora. Estou em erupção depois de muito tempo adormecida, estou pegando fogo após um longo período de sono profundo. Minha erupção é honesta, bruta, sincera, calada. Meu fogo sai na forma de sua matéria mais oposta: água. São através das lágrimas que consigo expelir minhas larvas mais quentes. Estou em atividade! Meu vulcão interior acordou e agora sou quem não durmo direito”.



Terminando de escrever estas palavras, ela dobrou o papel e o colocou dentro de um envelope de carta. Foi até a casa dele e se depositou na caixinha dos Correios.



Quando nós estamos em erupção, só queimando é que conseguimos nos curar novamente.
 

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